quinta-feira, 17 de abril de 2025

Bioassinatura em K2-18b? Vamos com calma.

K2-18b comparado com a Terra
Figura 1 – Representação hipotética do exoplaneta K2-18b em comparação com a Terra.
Fonte: NASA Exoplanet Catalog. 

A mídia comercial de diversos países noticiou com entusiasmo a suposta detecção das linhas espectrais das moléculas metano (CH₄) e dióxido de carbono (CO₂), além de uma possível assinatura de dimetilsulfeto (DMS), na atmosfera do exoplaneta K2-18b. A análise baseou-se em dados espectrográficos no infravermelho obtidos pelo Telescópio Espacial James Webb. Segundo os autores do estudo, essas moléculas poderiam estar associadas à atividade biológica, como o metabolismo de fitoplâncton terrestre. O planeta, classificado como um sub-Netuno (Figura 1), apresenta indícios de água líquida sob uma atmosfera rica em hidrogênio e orbita uma estrela anã vermelha. A hipótese de habitabilidade é levantada pelo fato de K2-18b situar-se próximo ao limite interno da zona habitável de sua estrela, onde a água, teoricamente, poderia permanecer em estado líquido (Figura 2).

Ainda assim, é necessário manter cautela diante de anúncios com implicações extraordinárias, especialmente quando amplificados pela imprensa generalista. Moléculas como as mencionadas podem ter origens abióticas plausíveis. Além disso, há a questão da robustez estatística da detecção, frequentemente negligenciada nessas discussões. Convém lembrar que jornalistas não têm a obrigação de dominar os fundamentos da inferência estatística. No entanto, chama atenção a recorrente veiculação de frases como “há 99,7% de confiança na detecção”, implicando que resta apenas 0,3% de chance de erro.

Essa interpretação é conceitualmente equivocada. Em termos estatísticos, o que se tem nesse tipo de análise é, geralmente, uma medida de razão sinal/ruído (S/N), que, quando igual a 3, é informalmente descrita como uma detecção “a três sigmas”. Isso significa apenas que a amplitude do sinal supera três vezes a estimativa local do desvio padrão do ruído — um critério operacional, mas não necessariamente um teste estatístico clássico com hipótese nula formal, correções para comparações múltiplas ou consideração de incertezas sistemáticas.

Basear a inferência unicamente nesse procedimento compromete a confiabilidade da conclusão. Considero a alegada “detecção” estatisticamente controversa por duas razões principais. Primeiro, nota-se, em muitos trabalhos recentes, uma fragilidade conceitual na aplicação rigorosa dos métodos probabilísticos. Segundo, há uma pressão estrutural crescente no meio acadêmico que favorece a divulgação apressada de resultados ainda incertos, seja por motivações institucionais, busca de financiamento ou necessidade de manter produtividade científica. Isso se agrava em sistemas como o norte-americano, onde a permanência de pesquisadores em universidades está frequentemente vinculada a métricas de impacto e publicação.

Sistema K2-18
Figura 2 – Posição do planeta no sistema K2-18.
K2-18b encontra-se próximo da chamada zona de habitabilidade, onde, em princípio, a água poderia existir no estado líquido.

quarta-feira, 22 de janeiro de 2025

Astrofotografias de grande campo na Ponta de Humaitá

Registro de algumas partes do céu visto da Ponta de Humaitá, em Salvador, no dia 20 de janeiro de 2025. As imagens foram obtidas entre 22h12min e 22h16min UT utilizando uma câmera Canon Rebel T100. As imagens 1 e 2, apresentadas a seguir, são o resultado do alinhamento e soma de cinco sequências corrigidas para poluição luminosa com o software Sequator. As especificações técnicas da primeira imagem de cada sequência estão detalhadas nas respectivas legendas. O campo das imagens é de 45.7 x 30.5 deg e a escala de placa 63.4 arcsec/pixel.

Imagem 1

1) 22:12 UT, 10 s de exposição, distância focal de 28 mm, obturador f/4.5 e ISO 400. Região das constelações de Orion, Eridanus, Monoceros, Lepus e Touro. Os traços descontínuos estão associados a um estágio inativo de um foguete Ariane I, lançado em 1986.


Imagem 2

2) 22:16 UT, 10 s de exposição, distância focal de 28 mm, obturador f/4.5 e ISO 160. Marte é o ponto vermelho ao lado de Pollux, na constelação de Gêmeos.

terça-feira, 21 de janeiro de 2025

C/2024 G3 (ATLAS)

O cometa ATLAS foi registrado na Ponta de Humaitá, em Salvador, no dia 20 de janeiro de 2025. As imagens foram obtidas entre 21h51min e 22h16min UT utilizando uma câmera Canon Rebel T100. As imagens 2 a 6, apresentadas a seguir, são o resultado do alinhamento e soma de cinco sequências corrigidas para poluição luminosa com o software Sequator. As especificações técnicas da primeira imagem de cada sequência estão detalhadas nas respectivas legendas.

De acordo com o COBS, a magnitude visual total do cometa foi estimada em 3,0, o que o tornava fracamente visível a olho nu em áreas urbanas com altos níveis de poluição luminosa.

O núcleo do cometa possui um raio mínimo estimado em 3,2 km, considerando que não seja hiperativo.

Imagem do cometa às 21:51 UT

1) Primeira detecção do cometa. Imagem única obtida às 21:51 UT, com 2 s de exposição, distância focal 55 mm, obturador f/5.6 e ISO 500.

Imagem do cometa às 21:58 UT

2) 21:58 UT, 2 s de exposição, distância focal de 55 mm, obturador f/4.5 e ISO 640. Imagens ligeiramente fora de foco.

Imagem do cometa às 22:01 UT

3) 22:01 UT, 2 s de exposição, 32 mm de distância focal, obturador f4.5 e ISO 1250.

Imagem do cometa às 22:02 UT

4) 22:02 UT, 2 s de exposição, 32 mm de distância focal, obturador f/5 e ISO 800.

Imagem do cometa às 22:05 UT

5) 22:05 UT, 10 s de exposição, 18 mm de distância focal, obturador f/4 e ISO 125.

Imagem do cometa às 22:06 UT

6) 22:06 UT, 10 s de exposição, 18 mm de distância focal, obturador f/4 e ISO 250.

terça-feira, 7 de janeiro de 2025

Azulejos Atômicos

O padrão de azulejos combina o modelo atômico de Rutherford com temas florais, típicos da decoração de muitas casas antigas de Salvador. Esses azulejos embelezam uma loja de molduras na Rua Carlos Gomes, no centro da cidade. Notei esse tema peculiar pela primeira vez há 20 anos, durante minha última visita ao local. Registro realizado em 07/01/2025.






domingo, 6 de outubro de 2024

Telescópios – Perguntas e Respostas (Q9)

Grandes diâmetros de objetiva: o maior sempre vence?

Se direcionarmos duas superfícies com áreas iguais — uma com o diâmetro de 6 cm e outra com 160 cm — para um astro qualquer, podemos concluir que a região com 160 cm de diâmetro recebe aproximadamente 710 vezes mais energia por unidade de tempo do que a de 6 cm. Essas superfícies coletoras podem representar, por exemplo, as objetivas de uma luneta Tasco e do refletor Perkin-Elmer do LNA/OPD. Dessa forma, é possível observar estrelas mais fracas utilizando telescópios com maiores aberturas.

A equação que sintetiza esse conceito é a da magnitude limite, expressa da seguinte forma:

M=7,1+5log(B)

Em que:

  • M é a magnitude limite (utilizando o olho humano como detector);
  • B é o diâmetro da objetiva do telescópio, em centímetros.

É importante ressaltar que, em ambientes urbanos, a poluição luminosa e atmosférica nos afasta da magnitude limite ideal obtida pela equação acima. De acordo com essa relação, um telescópio com 6 cm de abertura teria uma magnitude limite de 11. Contudo, ao realizarmos observações em uma cidade, podemos perder de 2 a 3 pontos nessa magnitude limite, o que a reduz efetivamente para valores entre 8 e 9.

Minha Vivência com o Colonialismo Cultural na Ciência

  Esta postagem tem um caráter de reflexão e registro para futuras gerações de cientistas brasileiros. Em 15 de dezembro de 2022, enviei uma...